Conversa com Amanda Cardoso da Silva sobre autonomia e cuidado no Abacatal (PA)
Sábado de manhã, computadores ligados, todos em frente às suas telas visualizando uns aos outros pelos quadradinhos do aplicativo de videoconferência. Assim foi a entrevista realizada por nossa equipe com Amanda Cardoso da Silva, moradora e agente comunitária de saúde do Território Quilombola do Abacatal. Esse território ancestral fica localizado a 8 km do centro da cidade de Ananindeua, localizado na região metropolitana de Belém-PA.
Contam suas moradoras e moradores que a origem do Quilombo de Abacatal remonta ao século XVIII, mais especificamente ao ano de 1710, quando há registro da herança do Conde de Coma Mello, que deixou suas terras para as filhas Maria do Ó Rosa de Moraes, Maria Felisbina Barbosa e Maria Margarida Rodrigues da Costa. As “Três Marias”, como foram batizadas pela memória coletiva do lugar, nasceram da violência colonial: eram filhas do Conde com uma de suas escravas de nome Olímpia.
Atualmente, o Território possui 312 anos de existência. Ao longo de sua história, o Abacatal enfrentou diversos desafios para a autonomia do seu território, desde tentativas de grilagem das terras por terceiros, até os impactos negativos de projetos econômicos e da urbanização da Região Metropolitana de Belém. As lutas históricas pela defesa do território motivaram a organização dos moradores, resultando na fundação da Associação de Moradores de Abacatal/Aurá, em 06 de março de 1988, hoje registrada como Associação dos Moradores e Produtores Quilombolas do Abacatal-Sítio Bom Jesus (AMPQUA). Trata-se da figura jurídica que representa a comunidade diante de órgãos públicos e da sociedade em geral.
O Território Quilombola do Abacatal obteve seu título de reconhecimento de domicílio no ano de 1999 por meio do Instituto de terras do Pará (ITERPA). Seus moradores receberam o Título Coletivo da Terra, direito que é previsto no artigo n.º 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1988, sob o enunciado: “Aos remanescentes das comunidades de quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos”. O Abacatal dispõe de uma área de um pouco mais de 518 hectares, com aproximadamente 150 famílias e cerca de 500 habitantes. Suas principais atividades econômicas são a agricultura familiar, extrativismo de açaí e o artesanato.
No território há um Posto de Saúde – que na verdade é um ponto de apoio estendido da UBS Aurá (o bairro mais próximo) à comunidade – que conta com uma agente comunitária de saúde, uma técnica de enfermagem e uma técnica administrativa, todas elas moradoras do Território. A enfermeira realiza seus atendimentos nas segundas-feiras e a médica vai à comunidade nas quartas-feiras. O trabalho de Amanda como agente comunitária de saúde, no entanto, é diário. Daí sua proximidade das pessoas no cotidiano e perspectivas únicas sobre a vida e o cuidado no território, o que justifica sua presença como interlocutora e a importância de nosso diálogo sobre as resistências dos quilombolas aos empreendimentos público-privados, sobre os impactos da pandemia, e sobre a atuação coletiva na garantia dos direitos do quilombo, além de ressaltar a centralidade da liderança feminina no Quilombo do Abacatal.
A entrevista a seguir foi realizada no dia 02 de julho de 2022, com a presença do professor Pedro Paulo Soares (Departamento de Antropologia da UFAM) e de Ozaias Rodrigues (pesquisador e doutorando do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da UFAM). A transcrição foi realizada por Ozaias Rodrigues e Ingrid Rodrigues, mestranda em Antropologia Social pelo PPGAS-UFAM.
Pedro: Amanda, você poderia se apresentar e falar um pouco sobre seu trabalho de agente comunitária no Abacatal?
Amanda: Bom, eu sou Amanda Cardoso, sou do Território Quilombola de Abacatal, um território que tem 312 anos de luta, de história e resistência. E ele fica aqui em Ananindeua, no Pará. Eu sou graduada em Biologia pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Hoje estou cursando a segunda graduação que é em Desenvolvimento Rural, um curso voltado para o campo da agricultura familiar em si e que é muito a nossa realidade aqui no quilombo. Eu trabalho como agente comunitária de saúde dentro do território e fora também. E aí, como diz a Vanuza[1], uma grande liderança aqui do território, quem melhor do que nós mesmos para cuidar de nós? A gente que conhece nossa realidade, que sabe o que passa e o que vive no dia a dia.
Então, meu trabalho é esse, fazer o acompanhamento das famílias aqui no território, ir lá naquela casa ver se aquele idoso está tomando corretamente o remédio. Faço o cadastro dessas pessoas, as visitas com frequência, acompanhamento de hipertensos e diabéticos para saber se estão fazendo a direitinho a dieta passada pela médica, se estão tomando remédio na hora correta, fazendo essa verificação. Às vezes tem pessoas para auxiliar, mas as vezes não tem. Então eu faço esse trabalho também. Ir até as gestantes saber se está indo corretamente às consultas, se está tomando a vacina, como está a alimentação, se está se sentindo bem. Então esse é um pouco do meu trabalho que faço aqui na comunidade. Também realizo marcações de consultas e sempre estou presente nas casas para fazer esse acompanhamento. Fazer essa busca ativa de pessoas que estão doentes, para poder dar aquela orientação, para que possam ir ao médico.
E aqui na comunidade as pessoas não costumam ficar muito doentes, graças a Deus. Elas fazem aquela consulta de rotina a mais aqui no nosso posto e o tratamento que a gente pratica muito é o caseiro, com as nossas plantas medicinais, que a gente utiliza bastante aqui em casa. É muito chá, xarope que a minha mãe faz, banho, principalmente para minha sobrinha, quando ela está com gripe.
Ozaias: Amanda, como é para você viver num território quilombola situado na região metropolitana de Belém, nessa fronteira que está ali entre o urbano e rural?
Amanda: Bom, primeiramente vou falar um pouco sobre o Abacatal em si. Abacatal para mim é tudo, é um lugar maravilhoso de se viver, a gente tem toda uma história, uma resistência, a nossa luta está em cada pedra, em cada árvore, cada pessoa. Aqui é muita união, é aquele ditado: a união faz a força – aqui funciona graças a Deus. E sobre a parte de estar situado bem próximo da cidade, a gente acaba sofrendo muitas influências, mas a gente está sempre resistindo e não deixa essas influências, como que eu posso dizer, nos impactarem de fato, fazer com que a gente mude a nossa cultura ou algo do tipo. Não, as influências estão lá e dentro do território a gente vive a nossa realidade. A gente sofre pressões diretas da cidade, com esses empreendimentos que vem afetando nossa comunidade. Mas aí é não deixar se abater, é sempre estar de pé, firme, resistindo a todo e qualquer impacto que possa nos atingir, é isso!
E sobre estar tão próximo da cidade, os nossos jovens, principalmente, sofrem muitas influências lá fora, mas a gente não deixa que isso nos abale. A gente está sempre aqui buscando nos reconectar, buscando sempre nossa ancestralidade, conversar entre nós, para que a gente possa sempre está aqui, firme e forte.
Ozaias: Eu queria te fazer uma pergunta que tem a ver também com a história do Abacatal: qual a importância da liderança feminina no Abacatal desde as ancestrais fundadoras até hoje?
Amanda: É, desde o início da história foi isso, mulheres. Mulheres sempre estão à frente do território e a gente vai levando, a gente vai resistindo. É muito forte a presença das mulheres aqui no território nessa luta pelo território, pela luta dos nossos direitos. E eu também faço parte da Associação, faço parte da comissão da comunidade, de sempre estar ali acompanhando, se reunindo com a coordenação para saber dos impasses, para ir nas reuniões, participar de manifestações. E nossa maioria são mulheres. A nossa coordenação é formada por dez membros e temos apenas um homem nessa coordenação. A nossa comissão é formada apenas por mulheres e é nós que estamos sempre na luta.
Um fato que ocorreu faz duas semanas: uma mulher apenas, de moto, parou uma obra, uma instalação na estrada que estava lá. O pessoal de uma empresa que está construindo um linhão[2], eles fecham as nossas estradas e não tem como a gente passar. E aí a gente tem que ficar esperando por muito tempo. Até mesmo eles fizeram um atalho, mas o atalho estava só lama para gente passar e apenas uma mulher conseguiu parar lá e a partir disso foram se reunindo vários moradores. Então, é muito forte a presença dessas mulheres na luta desde o início da história [entrevista interrompida]. Eu estava falando de como isso é forte desde o início da história, da nossa existência, desses 312 anos de história: são as mulheres que vem mais à frente. Os homens sempre estão contribuindo também, mas essa presença da mulher é tão forte e enraizada que vai passando de mulher para mulher e isso é maravilhoso.
Pedro: Eu queria fazer uma pergunta a respeito das pressões sobre o território: como esses empreendimentos [subestações, linhões, rodovias] afetam a saúde física e mental das pessoas? Como tu percebes isso a partir do teu trabalho?
Amanda: Bom, a nossa luta é tão grande contra esses empreendimentos que a gente fica cansado, fisicamente e mentalmente, mas desistir nunca é opção. A gente está sempre aqui se fortalecendo. As pessoas adquiriram muita ansiedade quando saiu a história que a rodovia Liberdade[3] ia cortar a nossa estrada. As pessoas dizem logo: “meu Deus como é que a gente vai passar na nossa estrada”, que [a rodovia] ia tirar nosso direito de ir e vir e isso prejudica mentalmente, ficar pensando no que a gente vai fazer, como a gente vai fazer. E essa luta contra os empreendimentos também cansa fisicamente: tem que ir para reuniões, a gente separa em grupos e vai para as reuniões, tem que ler os documentos e nisso a gente fica cansado. Às vezes estamos muito cansados mesmo de toda essa luta, mas a gente se reúne novamente: “vamos nos fortalecer entre nós mesmos e vamos seguir firmes e fortes”. Então, prejudica muito sim, a gente fica bem cansado, mas a gente está aqui, resistindo sempre e não são esses empreendimentos que vão nos parar. Com certeza não, nunca!
Ozaias: Levando em conta esses empreendimentos e a pandemia também, como vocês estão se cuidando no cotidiano, quais são as estratégias, como vocês estão se fortalecendo coletivamente para lutar contra tudo isso?
Amanda: Nesse período de pandemia, graças a Deus, quando a pandemia estava bem no auge, tivemos todo um cuidado aqui dentro do território. A gente fechou a comunidade para pessoas de fora. Até mesmo se alguém tivesse algum parente de fora, filho, a gente fechou justamente para proteger a população em si, toda. E tivemos também muitos remédios que os curandeiros fizeram, pessoas como a Vivia[4]. Ela colocava lá nos grupos da comunidade dizendo que quem quisesse xarope, algum banho, ela estava disponível para dar para as pessoas. E também tivemos o acompanhamento da nossa médica que vem toda quarta-feira para cá e da nossa enfermeira que vem toda segunda. Então, na pandemia a gente teve o nosso próprio cuidado e tivemos cuidados além também.
Quanto à parte do fortalecimento, a gente sempre busca conversar entre si, se unir para conversar para se fortalecer principalmente na parte desses empreendimentos: “a gente está cansado? Tá! Então bora se reunir e ver uma estratégia pra que o serviço não fique pesado pra todo mundo”. Tinha reunião no Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade (IDEFLOR), na Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade (SEMAS), nesses órgãos. “Bora dividir grupos de moradores que vão para uma reunião, outro que não vão, para que não saia pesado para todo mundo”. Aí quando a gente pensa as estratégias, a gente vai, se reúne novamente e vê o que a gente pode fazer para se fortalecer, porque a união faz a força e a gente sempre busca se reunir para estar se fortalecendo contra esses empreendimentos.
Sobre a pandemia, a gente teve reunião justamente para gente decidir em comunidade as melhores formas de se proteger e se fortalecer. Então, ficavam decididos alguns métodos de prevenções, como fechar o portão, pessoas não entrarem, evitar sair até mesmo da comunidade e só sair se de fato for meio obrigado, para que não tivesse tantos casos na comunidade. A maioria da comunidade da comunidade pegou, mas foram casos leves, graças a Deus. Não teve algo tão sério, a gente não teve perda, graças a Deus.
Ozaias: Uma coisa que eu estava pensando aqui: se as mulheres estão na liderança, então basicamente todo tipo de violência simbólica e física, que vai contra o território, impacta diretamente no primeiro momento as mulheres. Você chegou a pensar sobre como essa violência chega nos corpos femininos, como essa violência chega nas lideranças que são majoritariamente mulheres?
Amanda: Logo no início, quando começaram as obras da subestação da Equatorial Energia, eles abriram caminhos, estradas. Ficava um monte de homens, trabalhadores, nas estradas. As nossas mulheres passavam e eram o tempo assediadas por essas pessoas, desrespeitadas. Então a gente buscou essa forma de se unir para sair junto da comunidade, para que não passasse por isso e até evitar, pelo fato da gente ter uma companhia. A gente se encontrava no portão da comunidade e alguém dizia: “Olha, tô aqui no portão, alguém vai para fora agora?” Esperávamos mais pessoas se reunirem, para justamente não passar por isso. Até porque nessa época a gente teve um grande aumento da violência. Pessoas da comunidade eram sequestradas, colocadas no mato, pessoas abusadas. Foi um período muito crítico pra gente. A gente ficava com medo de sair. Eu mesma, sofri um grande impacto: morria de medo de sair do território para trabalhar. Tem casas que eu preciso visitar fora do território, que é do portão para fora. E eu ficava com medo. Eu não ia, explicava isso para a enfermeira, que eu não ia, que eu estava com muito medo. Até mesmo quando iam cinco ou seis pessoas, ainda assim a gente tinha medo. Ainda mais por ser mulher, que é complicado ser mulher nos dias de hoje. A gente ficava com muito medo mesmo. Essa aí foi uma das estratégias, graças a Deus, que funcionaram: de sair um grupo de cinco mulheres, até mesmo homens saindo junto, evitando essa violência.
Ozaias: Ainda sobre a pandemia, como foi o acesso à vacina no território?
Amanda: A pandemia teve um impacto muito grande no território, não só na saúde física das pessoas: muitas pessoas na pandemia tiveram ansiedade, tomam remédio até hoje. E o acesso à vacina, graças a Deus, foi logo de início, assim que começou a vacinação. Nós fomos um grupo priorizado. No começo era para os indígenas, eles estavam como prioridade. Como em Ananindeua não tinha [indígenas], tinha o pessoal da Venezuela, os indígenas de lá[5], que foram priorizados e o Abacatal logo foi priorizado também. Tivemos logo acesso à primeira dose e aí depois de um mês tivemos a segunda dose. Veio a terceira dose na comunidade e agora, nesse mês de julho, já está previsto para vir a quarta dose. O acesso à vacina, graças a Deus, foi ótimo. A vacina veio diversas vezes, veio para os adolescentes, veio para as crianças, aqui para o território, a primeira e a segunda dose. E agora está prevista a terceira dose para os adolescentes e a quarta dose para os adultos. Então, se deu de forma bem rápida a vacinação, não tivemos nenhuma dificuldade.
Ozaias: Como é que você enxerga o Abacatal como influência dentro do contexto das comunidades quilombolas do Pará? E também queria saber de você quais são as redes e as parcerias que vocês têm nessa luta.
Amanda: O Abacatal hoje é visto como um quilombo muito forte, de resistência, um grande exemplo para todos e isso é maravilhoso, poder estar levando a nossa voz, nossa luta, para outros quilombos. Porque muitos quilombos não sabem a força que têm e o Abacatal é isso de estar saindo para outros quilombos para mostrar o lugar de fala dessas pessoas, desses quilombos; mostrar que ele têm direitos, quais são os direitos deles, que muitas vezes não são reivindicados, às vezes por não ter uma parceria e até mesmo quem os auxilie.
O Abacatal, graças a Deus, tem várias parcerias. Nós mesmos procuramos conhecimento fora do território e trazemos para dentro dele, para repassar entre nós mesmos. A gente tem a Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE) que é um órgão que sempre está em parceria com o território, nos levando para participar de oficinas. Eu participei de uma oficina da FASE sobre território que foi maravilhosa. Eu fiz até um vídeo sobre isso, uma atividade que tive que fazer. Foi uma experiência muito boa, poder compartilhar conhecimento e também receber conhecimento de outras pessoas. Eram diversas pessoas, eram ribeirinhos, quilombolas, a gente fez esse compartilhamento de conhecimento para poder passar para as pessoas aqui dentro. A nossa parceria com a FASE é muito forte, graças a Deus. Ela que nos auxiliou também para fazermos o nosso protocolo de consulta[6].
Nós temos uma forte parceria do Ministério Público também, graças a Deus, sempre que a gente precisa, a gente corre para o Ministério Público. O fato de eu estar trabalhando hoje foi algo que a gente buscou pelo Ministério Público. A gente tinha antes um agente comunitário de saúde que não atendia as nossas demandas, até porque devia fazer o trabalho e não fez. A comunidade recorreu ao Ministério Público para que fosse ofertado no concurso vagas especificamente para moradores do território. E aí teve, várias pessoas da comunidade se inscreveram. E numa dessas eu passei. Então isso foi em parceria com o Ministério Público.
Nós temos a UFPA (Universidade Federal do Pará), uma grande parceira, graças a Deus, que tá sempre aqui na comunidade. Se a gente precisar do auxílio de alguns professores, do reitor também, eles sempre estão prontos a nos ouvir e nos atender. Assim também como a Cáritas, que é outro órgão muito importante, está sempre aqui na comunidade, nos dando várias oficinas. A gente teve oficinas sobre o protocolo, porque a gente tem o protocolo, mas às vezes a gente pode não saber certamente como utilizá-lo. Então a Cáritas está sempre fazendo esse papel, está nos dando oficinas e isso é muito bom para gente obter mais conhecimento. Então são fortes parceiros e isso é maravilhoso, vindo junto com a gente nessa luta, nessa caminhada, sempre resistindo e também nos orientando.
Ozaias: Como é a relação de vocês com os outros poderes, com o legislativo e com o executivo, tanto o estadual quanto o municipal?
Amanda: Com a prefeitura a gente tem pouca parceria e infelizmente para a gente conseguir algo através da prefeitura a gente sempre tem que partir para o Ministério Público ou para manifestação. A gente teve agora um caso recente, dos nossos professores do território. Eles não tinham assinado contrato, eles estavam trabalhando e não estavam recebendo. A gente está passando por isso novamente com os professores. E aí a gente sempre tem que partir para a luta, fazendo manifestação na frente da prefeitura, para que seja atendido. Parece que a conversa não resolve de fato, o que deveria resolver. Então a gente está sempre partindo para a luta, está lá se manifestado para ver se consegue alguma coisa. O que é de direito nosso, isso daí, assim como a nossa estrada também que é de direito nosso e a gente tem que estar sempre reivindicando, reafirmando, porque o quilombo é isso: é estar lá, sempre na luta, reivindicando seus direitos.
Pedro: Na comunidade tem um posto de saúde que é um braço da UBS, mas não é um programa de saúde quilombola. Qual seria a importância de ter um programa de saúde quilombola no território?
Amanda: Exatamente isso. O nosso posto, na verdade, é como se fosse um ponto de apoio. O posto central ele fica no Aurá aqui, que é o bairro próximo que a gente faz parte. Aqui a gente tem o médico apenas dia de quarta-feira e a enfermeira apenas dia de segunda-feira. O que deveria ser, na verdade, diferenciado. A gente deveria ter um dentista, consultório odontológico e isso a gente não tem. Deveria ter vacina, não tem. Farmácia, a gente não tem. A gente precisa sair de dentro do território para buscar esses atendimentos. Sendo que, por lei, a gente devia ter esse direito. O rapaz [funcionário] da Secretaria de Saúde me disse que está para ser implantado isso aqui no território, mas já faz um ano, dois anos que ele me falou e até agora nada disso foi implantado. Ele até veio visitar a nossa área ribeirinha, porque ele quer fazer essa separação do Aurá, para colocar uma equipe que é a quilombola-ribeirinha, para que a gente possa ter médico e enfermeira todos os dias e ter os outros atendimentos. Mas até agora isso só está em palavras. Ainda não tem nada na prática.
[1] Vanuza da Conceição Cardoso, nome social de Maberu Ynikô, entrevistada no episódio 6 do nosso Podcast Tucandeira, disponível no Spotify.
[2] Atualmente, duas empresas que atuam no setor de energia elétrica vem trazendo impactos negativos aos modos de vida no Abacatal: a Equatorial Energia S.A., com a construção de uma subestação de energia e de linhas de alta tensão, bem como a Sterlite Power, que seguiu com a instalação de uma linha de alta tensão após a conclusão das obras da Equatorial.
[3] Por se tratar de uma via expressa, com alta velocidade, de mão dupla e, aparentemente, sem previsão de infraestrutura para pedestres.
[4] Vivia da Conceição Cardoso, nome social de Makìnì, entrevistada no episódio 6 do nosso Podcast Tucandeira, disponível no Spotify.
[5] Indígenas da Etnia Warao. [6] Conforme a convenção 169, da Organização Mundial do Trabalho, estipulando que povos tradicionais que possam ser afetados por projetos econômicos, de infraestrutura ou atos administrativos, devem ser consultados de maneira prévia, livre e bem informada antes da implementação desses empreendimentos.
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